TORMENTA-06

...Fiquei hospitalizada por mais oito dias e fui liberada para passar o Natal com minha família, prometi que voltaria para realizar alguns exames e que não deixaria de tomar a Varfarina, para que o sangue não continuasse coagulando, promessa feita.
Chegando em casa após tantos dias longe, confesso que as coisas me pareciam estranhos, o ambiente, o som, as cores, não saberia explicar e acredito que ninguém o faria, pois tudo parecia muito sem sentido e meio estranho. Minha casa era a mesma, as pessoas não mudaram, nem a mobília mudara, mas eu mudei, não sei ao certo como ou o quanto, mas mudei e já não me via no mesmo contexto e com a mesma visão de antes.
Natal é tempo de renascimento e de reflexões, eu estava em casa novamente, estava rodeada das pessoas que eu amava, muitas visitas e muitas pessoas falavam muito sobre a importância que minha presença fazia em suas vidas, muitos amigos e familiares, festa. Mas eu ainda não me encontrava, estava com a sensação de estar olhando a tudo e a todos como se fosse a primeira vez.
Minha cabeça ainda estava com a sensação de vazio de lembranças e eu tentava me situar no tempo, tentava me lembrar onde o meu tempo parou e onde eu estava agora, parecia que o tempo não me esperou e passou rápido demais e agora eu precisava me atualizar dos fatos.
Chegou o Natal e como em todos os anos minha mãe e meu pai vieram passar em minha casa, minha mãe comemora seu aniversário dia 25 de dezembro e por esse motivo o meu natal sempre teve bolo e cantada de parabéns, para minha mãe e para Jesus Cristo.
Passadas as datas festivas, chegado o momento de procurar o Dr Roberto Carlos, conforme prometido, para realizar alguns exames e saber a gravidade da trombose.
Cheguei cedo ao consultório, quando o médico me viu ficou maravilhado com a minha aparência, ele segurou e analisou minhas mãos, falou que nem de longe eu parecia aquela pessoa totalmente deformada pelo inchaço, eu fiquei feliz com esse comentário. Ele indicou um exame chamado Ecodoppler.
A cada mês eu precisava realizar exame de sangue para controlar o RNI (tempo de protrombina), não poderia ultrapassar 2,5 e deveria ser regularmente monitorado.
Realizei o Ecodoppler e levei para que ele desse o diagnóstico, não era muito animador,  pois a trombose estava ativa apesar do anticoagulante e cirurgia não era indicado para o meu caso, realizei outros exames, inclusive dos pulmões para saber qual conduta a ser seguida.
Fiquei proibida de comer e/ou beber qualquer alimento que favorecesse a produção da vitamina K.
Seguia todas as orientações à risca e não conseguíamos controlar o avanço da trombose. Meu corpo criou um "socorro" para ajudar o meu coração a trabalhar, pequenos vasos espalhados em meu tronco.
Continuei com o tratamento com varfarina por mais alguns meses e parei, segundo o médico não adiantava colocar minha vida em risco, meu corpo não estava reagindo ao anticoagulante.
Me sinto um milagre ambulante passeando pela vida. Sou atleta e pratico atividade física todos os dias, não tenho tempo para pensar quando ou como vou mudar de dimensão, eu gosto de ficar aqui na terra e pretendo ficar muitos anos ainda, penso que viverei muitos anos ainda e ainda vou ensinar muita gente que a vida é uma passagem única, o que fazemos para que nossa existência seja uma forma de agradecimento por cada amanhecer e por gota de chuva que molha a terra em que pisamos, cada perfume e cada cor que a natureza oferece é único, nenhum milésimo de segundo volta e a vida é uma máquina engrenada para seguir sempre em frente, por tanto, não podemos retroceder e nem perder o nosso tempo reclamando.



TORMENTAS-05

...começou a investigação para diagnosticar aquela doença.
Vários exames de imagem foram realizados e nada de descobrir o que eu tinha.
Meu corpo inchava absurdamente e eu ficava cada vez mais sem capacidade de respirar sem a ajuda do oxigênio, recebia auxílio diário de uma fisioterapeuta e uma fonoaudióloga que me ensinavam exercícios de respiração.
Meus familiares e amigos me visitavam e à primeira vista era nítido o susto que esboçavam ao me ver, estava irreconhecível.
Numa manhã que não me lembro a data, precisei pulsionar uma veia para realizar um exame de contraste, porém não havia como encontrar o acesso devido ao inchaço, tentaram várias vezes nas mãos, braços e pés, não conseguiram; o chefe de enfermagem, me lembro o nome dele e acredito que nunca vou esquecer, Flávio, aproximou-se e olhou fixamente em meus olhos perguntando se eu confiava nele, sentia que tremia e suava, parecia estar mais apavorado que eu, respondi positivamente com a  cabeça que confiava sim, ele então pediu que mantivesse o pescoço virado para meu lado esquerdo e não mexesse em hipótese nenhuma, pois ele precisava colocar um cateter na minha jugular e certamente não seria muito confortável, mas era necessário. Fiquei imóvel, sentia as suas mãos trêmulas e sua respiração ofegante, demonstrava muito cuidado em não me causar mais dor do que já sentia.
Cateter colocado, fui conduzida ao local onde seria realizado o exame, voltei logo para o quarto, tive muita náusea e vomitei, acredito que devido ao jejum e ao contraste.
Uma equipe médica entrou em meu quarto acompanhados do doutor Teriovaldo, que compareceu ao hospital a meu pedido e ao me ver indagou se já haviam feito exames direcionando a enfermidade à trombose de cava superior, pois a minha aparência sugeria esse quadro. Após discutirem o caso, o doutor Roberto Carlos se dirigiu até mim e disse que na manhã seguinte ele iria me operar e tirar o causador daquela doença, o cateter colocado para realizar quimioterapia  e que não havia sido heparinizado seria o vilão da vez.
Na manhã seguinte, um domingo, fui submetida a uma cirurgia para retirada do cateter, na segunda feira já estava menos inchada e respirava sem oxigênio, graças a Deus as coisas estavam voltando ao normal.
Fiquei hospitalizada por mais oito dias e fui liberada para passar o Natal com minha família.